quinta-feira, 9 de março de 2006


"A Espuma dos Dias" - Boris Vian


Estou a ler um livro fabuloso. Sim, esse do título.
Recomendo vivamente sobretudo a pessoas com dificuldade em ler à noite, por adormecerem a meio das páginas. Garanto-vos que nao faz a mínima diferença. E para o provar, aqui fica um excerto:


" - Tomas uma aperitivo? - perguntou Colin. - O meu pianocktail já está pronto, poderias exprimentá-lo.
- Funciona?
- Perfeitamente. Foi-me difícil repará-lo, mas o resultado ultrapassa as minhas expectativas. Obtive uma mistura verdadeiramente atordoante, a partir do Black and Tan Fantasy.
- Qual é o princípio da tua invenção? - perguntou Chick.
- A cada nota faço corresponder um ácool, um licor ou uma substância aromática. O pedal forte corresponde a ovo batido e o pedal surdina a gelo. Para água-de-seltz é preciso um trilo no registo agudo. As quantidades otidas estão na razão directa das durações: a semifusa equivale à décima sexta parte da unidade, a semimínima à unidade, a semibreve ao quádruplo da unidade. Desde o momento em que seja tocada uma ária lenta é posto a funcionar um sistema de registo, de forma a aumentar a percentagem de ácool em vez da dose - o que daria um cocktail demasiado abundante. E querendo, atrazés de um sistema lateral e regulador, pode fazer-se variar o valor da unidade consoante a duração da ária, reduzindo-se por exemplo à centésima parte, a fim de ser possivel obter uma bebida que entre em linha de conta com todas as harmonias."

And so on, and so forth. Nada faz sentido. Vian usa o estilo surrealista de uma maneira muito própria, tornando o livro embora confuso nesse aspecto, nada difícil de ler. Usa ainda adjectivações invulgares, termos inventados ou satíricamente deformados (por diversas vezes se encontra o nome Jean-Sol Partre, alusão satírica a Jean-Paul Sartre, por exemplo), tornando a coisa muito divertida. O problema será então, não adormecer a meio das páginas, mas pelo contrário, não conseguir pousar o livro e no dia seguinte não ouvir o despertador.
A tradução não me agrada especialmente (o original é francês - L'Écume des Jours), mas tendo em conta que esta edição é de 1963, tenho a esperança de um dia vir a encontrar uma mais recente, e verificar que foi melhorada (há 2 anos que andava a procura, mas está sempre esgotado).